Luiz Carlos da Vila recebe biografia que o destaca como personalidade do Rio
Por Redação
No último sábado (15) a livraria Folha Seca, no Centro do Rio, foi o palco do lançamento do livro “Princípio do infinito: um perfil de Luiz Carlos da Vila”, do historiador Luiz Antônio Simas e do jornalista Diogo Cunha.
O acontecimento foi marcado por uma roda de samba, comandada por Moyseis Marques, Bira da Vila – amigo de Luiz Carlos e parceiro em algumas composições e o grupo Ciranda.
O Portal Sambrasil do jornalista Marcelo Faria, que é o Maior Portal de Notícias, Pesquisas e Referências sobre o Mundo do Samba, já havia dado uma nota anteriormente sobre o livro, agora destaque a noite de lançamento do livro. E tem o prazer e a satisfação de sugerir mais uma ótima opção de leitura, no universo do samba, existe uma vasta literatura sobre o gênero musical, que é o maior patrimônio cultural do Brasil. Na coluna Biblio Samba do Portal Sambrasil estão outras dicas desta literatura.
A capa do livro é do artista plástico Mello Menezes e a apresentação da obra é do grande Aldir Blanc.
O carioca Luiz Carlos da Vila faleceu em outubro de 2008 aos 59 anos. É, sem dúvida, o mais talentoso compositor da geração do Cacique de Ramos, pela versatilidade musical no samba, poesia intensa na letra e uma maneira singular de se expressar. Porém, teve um reconhecimento em vida menor do que a grandeza de sua obra.
Luiz Carlos da Vila, ou das Vilas, como gostava de chamá-lo Nei Lopes, é um dos principais nomes da geração Cacique de Ramos, primeiro grupo de compositores de samba que surge à margem das escolas. O Cacique é um bloco fundado no começo dos anos 1960. No final da década de 1970, um grupo de amigos resolveu organizar, às quartas-feiras, uma pelada regada a churrasco, cerva e, claro – com o tempo –, um samba de fundo de quintal. Nascia aí o seminal pagode (festa, encontro, reunião de sambistas) do Cacique de Ramos, que influenciaria a formação de outros espaços de samba na cidade e nos legou compositores do mais alto padrão na história do gênero: Arlindo Cruz, Zeca Pagodinho, Almir Guineto, Beto sem Braço, Jorge Aragão e o boleiro e botafoguense, Luiz Carlos da Vila.
A nova geração do samba trouxe uma instrumentação diferenciada para o gênero: o banjo, com braço de cavaquinho, foi popularizado por Almir Guineto; Ubirany passou a tocar um repique fechado em um dos lados e Sereno lançou mão do tantã tocado deitado, substituindo o velho surdo de marcação.
É nesse terreiro que Luiz desponta, sobretudo quando a madrinha do pagode, Beth Carvalho, grava sua primeira canção de sucesso, “O sonho não acabou”. Foi debaixo das tamarineiras – árvore que, segundo a tradição, realiza pedidos de pessoas que por ela passam – do cacique, bebendo uma cerveja com Ubirany, que nosso personagem compôs o hino de uma geração extremamente talentosa, “Doce refúgio”:
“Sim, e? o Cacique de Ramos
Planta onde em todos os ramos
Cantam os passarinhos nas manhãs”.
Essas e outras deliciosas histórias estão no livro “Princípio do infinito, um perfil de Luiz Carlos da Vila”, escrito por Luiz Antônio Simas e Diogo Cunha, primeira biografia do compositor Luiz Carlos da Vila, produzida pela Arte-Fato e lançada pela Editora Numa. Os autores já são conhecidos pelo público que acompanha a literatura musical carioca. Simas, inclusive, é detentor de destacados prêmios nacionais, como o Jabuti, em parceria com Nei Lopes (“Dicionário da história social do samba”), e o Prêmio Edison Carneiro (“Titias da Folia”).
“Luiz Carlos da Vila era rebuscado demais para ser sambista e, ao mesmo tempo, sambista demais para ser reconhecido como grande nome da música brasileira”, avalia Luiz Antonio Simas. Segundo ele, pelos dois lados, “é latente o preconceito ao samba”.
A obra deixada por Luiz Carlos da Vila foi diversa, desde a clássica “O show tem que continuar” (dele com Arlindo Cruz e Sobrinha) até o inesquecível samba enredo que deu o título a Vila Isabel em 1988: “Kizomba, a festa da raça” (dele com Rodolpho e Jonas).
“Ele transitava por todas as linhas do samba: samba-enredo, partido alto, samba de terreiro, samba canção. Era um melodista bom e letrista excepcional”, ressalta o historiador.
Sobre o perfil literário de Luiz Carlos de Vila, Simas explica que o cantor e compositor era um típico personagem do subúrbio do Rio de Janeiro. Nascido no bairro de Ramos (onde inclusive encontra-se o Cacique), viveu por longos anos na Vila da Penha.
“A linha do livro foi entender Luiz Carlos da Vila a partir da cidade. A importância do livro é reconhecer Luiz Carlos como grande personagem do Rio de Janeiro, da peculiar região da Leopoldina, nascido em Ramos e criado na Vila da Penha”, conta o escritor.
“Princípio do infinito”, que dá nome ao perfil, é uma música de Luiz Carlos da Vila com o violonista Claudio Jorge – ela recebeu primorosa gravação em 2001 no CD “Coisa de chefe” de Claudio Jorge. Essa composição dá a dimensão da força e da capacidade de Luiz Carlos de transpor o sentimento comum por meio da música: “Que é um amor bem mais / Do que o amor que faz / Apenas um amor bonito / É a guerra e a paz / Bruxas e orixás / Princípio do infinito”.
O acréscimo de “da Vila” ao seu nome foi feito por Beth Carvalho e Martinho da Vila, diz Simas. “Colocaram para diferenciar de outros Luiz Carlos”, afirma. O “da Vila” do sambista está relacionado à Vila da Penha.
Mas foi Nei Lopes que “resolve bem a questão”, de acordo com Simas, “quando o chama de Luiz Carlos das Vilas, que é da Vila da Penha, da Vila Isabel e do Cacique de Ramos, que não deixa de ser uma vila”.
As ricas composições de Luiz Carlos da Vila fizeram alguns intérpretes crescerem profissionalmente. A cantora Simone deu luz à sua carreira com a gravação da bela “Por um dia de graça” (Luiz Carlos da Vila). “Um dia, meus olhos ainda hão de ver / Na luz do olhar do amanhecer / Sorrir o dia de graça…” Luiz Carlos me disse uma vez que Simone lhe telefonou perguntando se ele tinha composto algo parecido com a música que a ajudou a firmar a sua carreira de cantora. Na conhecida sagacidade do compositor, ele respondeu: “Simone, peraí, não é todo dia que a gente faz isso”.
Em dois shows que produzi da roda de samba do Candongueiro em São Paulo (SP), em 2005, Luiz Carlos da Vila foi um dos convidados. Numa noite foi brilhante, na seguinte nem tanto, embora tivesse repertório autoral farto para isso. Essa oscilação me apresentou um músico bastante inquieto, mas digno dos grandes criadores.
O livro “Princípio do infinito: um perfil de Luiz Carlos da Vila”, de Luiz Antonio Simas e Diogo Cunha, é o primeiro registro literário sobre esse histórico sambista – a sua frente eu posiciono somente Candeia, pela facilidade e maestria também com que circulava pelos vários estilos de samba.