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Danilo Vieira traça em matéria especial um raio-X dos 100 anos do Samba

Por Redação

Dia 27 de novembro de 1916. É a data do “registro de nascimento” do que historiadores dizem ser o primeiro samba: “Pelo telefone”. Em homenagem aos 100 anos do ritmo nascido e criado no Rio de Janeiro, o RJTV realizou cinco reportagens especiais, reunidas nesta página especial.

CAPÍTULO 1: CASA DA TIA CIATA E ‘PELO TELEFONE’

Na primeira reportagem da série, exibida em 4 de novembro, bambas como como Martinho da Vila e Monarco contam como foi o nascimento do ritmo na casa da baiana chamada Hilária Batista de Almeida, a Tia Ciata, que ficava no Centro do Rio (clique na imagem abaixo para ver a reportagem).

“O pessoal do samba ia pra casa dela, pra esse local, que era essa mistura de centro espírita, lugar onde morava e samba”, diz Martinho.

Para Monarco, da Velha Guarda da Portela, Tia Ciata impulsionou o ritmo. “Aquilo era um reduto de resistência, o samba era marginalizado. Ela ajudou a levantar a bandeira do samba.”

“Tia Ciata faz parte das histórias do mais velhos pros mais novos. Na Bahia isso já existia, e aqui no Rio , através de tia Ciata, ali encontrava o ritmo, a cultura , a música e o axé. Naquela casa era uma formação de conceitos. Conceito para direcionar naquela época o negro na cidade do Rio de Janeiro”, explica Mãe Torody.

Depois do surgimento do ritmo na casa da Tia Ciata, o samba teve seu “registro de nascimento” feito na Biblioteca Nacional: no dia 27 de novembro de 1916, o primeiro samba, batizado de “Pelo telefone”, foi registrado pelos autores Donga e Mauro de Almeida. “Pelo telefone” provocou polêmica após o registro. Há quem diga que as criações eram coletivas. Além disso, posteriormente se questionou que o ritmo é, na verdade, um maxixe.

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De qualquer maneira estava dado o pontapé inicial para nomes como Ismael Silva, o autor de “Se você jurar”, transformarem o ritmo em algo com o andamento mais parecido com o que conhecemos hoje.

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CAPÍTULO 2: DO ESTÁCIO AO RÁDIO, PASSANDO POR NOEL

Asegunda reportagem da série, exibida em 11 de novembro, conta a história da turma do Estácio, de Donga e Ismael, e da chegada do ritmo às ondas da Era de Ouro do rádio, que popularizou o samba. Um personagem inesquecível passa de forma avassaladora pela trama: Noel Rosa.

Um grupo de caras incríveis, que nasce na mesma época, vive no mesmo lugar e cria junto algo que fica na história. De tempos em tempos acontece no mundo. Alguns exemplos: os sábios da filosofia na Grécia – Sócrates, Platão e Aristóteles; o inesquecível quarteto do rock na Inglaterra – Lennon, Paul, Ringo e George; os gênios italianos da arte – a Renascença.

No Rio, a renascença foi um pouco diferente: com pandeiro e tamborim. Trata-se do samba, artigo nacional.

Estácio, década de 30. Uma rapaziada mudou a história da música brasileira. Donga, João da Baiana, Ismael Silva, Bide, Marçal e muitos outros. A turma do Estácio fez uma revolução. Inventou um novo ritmo e fundou uma nova escola.

“’A primeira escola de samba surgiu no Estácio de Sá / Eu digo isso e repito e posso provar’. O Ismael contava que os vizinhos reclamavam do barulho e ele dizia: ‘ah! Deixa falar, deixa falar”, canta e conta Monarco.

A cidade comprou o barulho e o samba se espalhou. Estácio, Salgueiro, Mangueira, Oswaldo Cruz, Matriz… E a Vila – “Que não quer abafar ninguém, só quer mostrar que faz samba também”, como diria o poeta.

É neste ponto que entra Noel Rosa. Talvez o fenômeno mais avassalador da música brasileira. Dono de uma vida curta e de um repertório vasto, morreu aos 26 anos. Deixou quase 500 músicas. O segredo desse feitiço? Pode-se dizer que além do imenso talento, Noel deu sorte de ser vizinho de uma generosa fonte de inspiração.

“Noel atravessava a Rua 8 de Dezembro e ficava lá em Mangueira. Seu Carlos dizia: ‘Monarco, ele ficava aqui sambando magrinho com a gente aqui’ (…) Ele adorava o Cartola, ele gostava daquela linhagem”, lembra Monarco.

A essa altura ele já tinha tudo. Ritmo, melodia, inspiração. O samba estava mais que pronto. Mas ainda faltava alguma coisa. Faltava um jeito de chegar a muita gente, em muitos lugares e ao mesmo tempo. Foi aí que algumas ondas – quase estáticas – começaram a se agitar, viraram um maremoto. Começava a Era de Ouro do Rádio.

Mas tanto sucesso, claro, tinha um preço. Na época, muitos cantores comprava seus sambas de compositores. “O cantor queria um samba, aí ele ia em um desses compositores. O Francisco Alves fazia muito era fazer uma parceria. E ele sendo parceiro, ele dava uma vantagens pro cara. Ele dava favores. Às vezes ele não comprava, ele dava uns adiantos. Dava um ‘cala a boca’ aqui. Foi outro tempo, né? Que coisa incrível”, conta Martinho da Vila.

CAPÍTULO 3: A INFLUÊNCIA DE COPACABANA

Oterceiro capítulo da série, exibido no dia 25, apresentou as influências de Copacabana sobre o ritmo. As boates abrigavam variações do samba e o nascimento de novos artistas. O estilo mais cadenciado do samba abre alas para vertentes como o samba de breque.

Com pouco mais de 40 anos, Copacabana era nos anos 50 uma senhora de ousados predicados. Sedutora, curvilínea, provocativa, cativante… Os homens a desejavam, as mulheres a copiavam, Copacabana era a menina dos olhos daquela cidade.

“Não havia ninguém no Brasil, nos anos 50, que não sonhasse conhecer Copacabana. E quando finalmente vinham ao Rio e chegavam a Copacabana, Copacabana não decepcionava ninguém. Era muito mais do que eles esperavam”, disse o escritor Ruy Castro.

Ninguém passava por ela em vão. Se Copacabana moldou um novo estilo de se levar a vida, também moldou um novo estilo de se fazer um samba. “Geralmente no samba canção não tem percussão, é uma bateria ou um regional tocando com pandeiro, é uma coisa mais suave”, explica o baterista Wilson das neves. “E a musica que se passou a fazer, o samba canção, era uma coisa mais tímida, mais contida! O samba canção já vinha dos anos 30 e 40, mas ele não tinha um ambiente onde ele pudesse ser tocado, quando as boates surgiram, ele encontrou seu habitat natural”, acrescenta Ruy Castro.

E assim como havia o choro-canção, o tango-canção, a valsa-canção… Surgiu o samba-canção. Era o andamento certo, no lugar certo. É dessa época que surgem as boates, considerado pelo escritor, o local ideal para reproduzir o samba-canção que já começava a se alastrar pela cidade.

“Toda boate tinha o seu piano, um contrabaixo , uma bateria de leve e um instrumento de sopro. Ou dois e o seu cantor que fazia a sua entrada às 23h, depois 1h da manhã, depois 3 da manhã porque as pessoas chegavam às boates a qualquer hora. Elas abriam às 7 da noite e não tinham hora pra fechar”, conta Ruy Castro.

Pedro Miranda e músicos cantam samba de breque: estilo teve como grande representante Moreira da Silva

O samba segue então incorporando novos instrumentos e variações. Novos artistas como Moreira da Silva surgem e passam a fazer parte das noites de show os chamados samba de breque, o samba sincopado, a gafieira. “A diferença na música está no ritmo. É o ritmo que define o que é que você está tocando”, conta Wilson das Neves.

“O samba de breque tem uma característica que é muito marcante. As letras do samba de breque são letras muito bem humoradas, que contam historias, é uma cronica. O breque é um samba que tem como característica o bom humor, explica o pesquisador Luiz Antônio Simas.

Ainda segundo Simas, o samba sincopado síncope permitia que os artistas brincassem com a letra de uma música durante seu andamento e encaixassem letras que se achava que iam caber. “A síncope é o deslocamento do tempo forte”, acrescenta Das Neves. O ritmo sincopado é visto também no samba de gafieira, mas com acompanhamento orquestral, característico das gafieiras de subúrbio do Rio de Janeiro – um ambiente oposto ao ambiente de samba canção.

CAPÍTULO 4 – JACKSON DO PANDEIRO E A INFLUÊNCIA DO NORDESTE

Em mais um capítulo da série, exibido dia 7 de dezembro, o RJTV abordou a influência do nordeste e seus ritmos no samba, principalmente na figura de Jackson do Pandeiro. Ele foi um dos responsáveis por introduzir uma mistura de sanfona e pandeiro e personificou o momento em que o sertão encontrou o samba .

Original da Paraíba, no Nordeste do Brasil, o artista queria um nome de herói do faroeste americano. Entre os nomes Joe, Jim ou Jack, José Silva resolveu escolher Jackson do Pandeiro. O nome levou em consideração que o cowboy dos Estados Unidos é o sertanejo brasileiro.

O diferencial era o ritmo que só ele tinha. Jackson tocou em banda de cabaré, orquestra de rádio, misturou chiclete com banana, Miami com Copacabana e ganhou fama. A partir daí gravou inúmeros sucessos pelo Brasil, como ‘A Ordem é samba.

CAPÍTULO 5: FUNDO DE QUINTAL

O último episódio da séria do RJTV sobre os 100 anos do samba falou sobre o samba de fundo de quintal, a partir da história do Cacique de Ramos .

Quem chegasse ao Rio de Janeiro nas décadas de 70 e 80, querendo descobrir o que o samba tinha de mais tradicional e inovador ia encontrar uma cidade repleta de discotecas. Mas o samba sabia, que por mais densa que fosse aquela neblina, havia um porto seguro. Eram as terras de um Cacique. De um tal Cacique de Ramos.

“Foram praticamente três famílias nascidas e criadas aqui no subúrbio da Leopoldina. Vamos dizer, Ramos, Olaria. Então, a gente via os blocos, via essa coisa toda. E a gente tinha sempre assim, nas nossas casas, na casa dos companheiros, sempre tinha uma reuniãozinha com samba, com essas rodinhas de samba, com pessoas que naquela época já eram importantes na música. E, simplesmente, com esse relacionamento dessas três famílias, nós criamos o Cacique de Ramos”, lembra Bira Presidente, um dos fundadores.

“Era uma época romântica que a gente viveu, andando de ônibus, na carona do Ubirani. Saía de madrugada, ele me deixava em Cascadura, lá no Morro do Fubá. Às vezes deixava o Zeca no Irajá. A gente tomava um café da manhã na padaria aqui”, lembra Arlindo Cruz, também fundador.

Pouco dinheiro, mas muita alegria e, principalmente, muita hospitalidade. O Cacique de Ramos estava sempre de portas abertas. “Aqui era o lugar onde o compositor poderia mostrar o samba novo, podia mostrar o samba novo com tranquilidade, porque era respeitado, era ouvido, A turma estava toda aqui. Vieram grandes produtores aqui, para buscar samba”, explica Ubirani, outro fundador do Cacique.

Arlindo acrescenta: “Era um prazer muito grande quando a gente ouvia um samba novo, por exemplo, do Beto Sem Braço, que tinha um refrão muito forte. Ou do Jorge do Sereno! Do [Jorge] Aragão, Luis Carlos da Vila…”

“Então, se tornou um reduto onde os compositores das grandes escolas de samba começaram a participar e conquistar seus espaços maiores, através dos seus sambas. Não só o samba enredo”, diz Bira.

Samba, carnaval, futebol, churrasco, cerveja, amizade. Misture tudo isso e deixe cozinhar: está formado o Fundo de Quintal. A formação oficial tinha seis integrantes, mas, no fundo, era muito mais: “Era uma coisa assim, maior que o grupo, porque tinha várias e várias pessoas que saíam juntas. Nelsinho, Tio Hélio, Nilton Manhães. Eram as pessoas que faziam samba com a gente. A filosofia era bem maior, com todo mundo que era do Cacique, que vinha na roda de samba, que era compositor, se sentia um pouco, era também um pouco fundo de quintal”, conta Arlindo.

Para entender como o Fundo virou o Fundo é preciso voltar a 1977. Foi naquele ano que um cara chamado Alcir ligou pruma moça chamada Elizabeth e perguntou: “Ô, Beth, tá afim de ir num samba hj?”.

“Aí ele falou: ‘Eu vou te levar num lugar que você vai gostar muito’. Falei: ‘Qual?’. ‘Cacique de Ramos!’. Eu digo: ‘Não brinca!’”, lembra Beth Carvalho. “Cheguei lá tinha uma turma. O grupo Fundo de Quintal estava ali. Jorge Aragão, Almir Guineto, Bira, Ubirani, Sereno, Sombrinha.

Arlindo se lembra bem: “Ela percebeu esse som todo, né, essa sonoridade. Ela não é boba nem nada, falou: “São meus afilhados, com muito orgulho”. Mostrou a gente pro mundo inteiro”.

“Era o meu lugar de lazer, eu ia pra lá jogar carta, escutar a rapaziada cantar samba, tudo inédito, tudo inédito! Até que, em 78, eu falei: pô, eu tenho que gravar esses caras. E foi o que aconteceu. Aí eu estourei com “Vou festejar” do Jorge Aragão [com Dida e Neoci]. “Um grupo todo bom, na mesma hora, foi uma coisa muito rara. E eu tive a sorte de ser madrinha dessa história aí.

O Fundo de Quintal tinha versos de rara inspiração, ótimas melodias, mas o grupo era diferente mesmo por três motivos, com explicam os sambistas: Beth: “O banjo com afinação de cavaquinho, que o Almir Guineto criou” Arlindo: “Banjo é harmônico e percussivo ao mesmo tempo. Tem um suingue melhor, tem umas notas que soam mais altas dentro de uma roda de samba”.

Beth: “O tantan, que foi criado pelo Sereno. A forma de tocar, foi ele que criou”. Sereno: “Nós não usávamos essa parafernália de microfone. Era tudo na, conforme se dizia, na unha seca”.

Beth: “Principalmente o repique de mão, que foi criado pelo Ubirani, o Ubirani criou esse instrumento”. Ubirani: “Agora foi uma criação feita pra ter esse casamento feliz. A repicada, a brincadeira que se faz no repique, tem a ver com o tempo forte do tantan. Então, esse casamento é de uma felicidade muito grande”.

Se inovou na forma de tocar, o Fundo respeitou, defendeu e divulgou as tradições do samba. Uma em particular: a tradição do partido alto. “Partido alto é brincadeira do samba. Partido alto é tipo um jogo. A gente canta um refrão e se versa, contando uma história ou brincando com alguém”, explica Arlindo.

Essa foi a história de uma pequena tribo, que virou um grande grupo. Um grupo que tomou partido e lutou pelas tradições sem nunca deixar de olhar pra frente. E que ninguém duvide: este samba só deus bons frutos porque tem uma boa raiz.

FINAL: O SAMBA DA BENÇÃO

No encerramento da série, RJTV fez homenagem aos grandes nomes do samba, com a música “Samba da benção”, de Vinicius de Moraes. “É melhor ser alegre que ser triste…” .

Fonte: G1 – Por Danilo Vieira

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