11. VAI – VAI é a quarta escola a desfilar no Sambódromo do Anhembi
Reportagem: João Paulo e Roberta Campos
A maior campeã do carnaval de São Paulo tenta seu 16º título desfilando com 3 mil componentes. A escola do Bixiga mostrou as lutas do povo negro e o que chamou de “quilombo do futuro”.
A bateria se fantasiou de Pantera Negra, herói negro da Marvel. O movimento americano dos Panteras Negras foi homenageado no terceiro carro, destacando a luta contra o preconceito nos Estados Unidos.
SINOPSE
Eis o Elo perdido, que todos encontrem os seus, conectem-se com o cordão do umbigo, com os velhos mentores de suas tribos.
Dos em cor de bronze e ébano esculpidos, esse sou eu.
Estou na estrada, sou o senhor do tempo, rezo por calmaria e sopro pra fazer vento, meus braços vertem-se em asas se necessito pressa, o tempo urge, a hora é essa.
Ouvi o chamado de vossos tambores, dos cantores, o clamor por justiça.
Que corra a notícia que o Afronauta Griot está em Terra, avisa aos poetas, magos, trovadores que tenho a chave da sala secreta que guarda as raízes de nossa esfera, aos pintores, que trago todos os matizes para que realizem a primavera.
Minha missão só se encerra quando o sol subir ao meio dia e, assim, da sombra eliminada a geografia, que nunca mais sobre nós, haja treva.
Desacorrentem a história, recuperem a memória, restituam o esplendor, a glória à Mãe das civilizações, que os livros devolvam os tons, as tantas nuances marrons à terra dos Faraós, façam com o colorido em nós a face dos Orixás, porque o Orum é assim, não há em Aruanda nenhum que não seja retinto, nenhum tão diferente de mim, Minha África é Mãe da magia, berço da metalurgia, da escrita.
Essa idosa senhora trouxe o sol da religiosidade à alma do ser humano, não é por acaso o Sinai erguido em solo africano.
Ali e na vizinhança o mundo emerge da infância e torna-se adulto.
Eu, por ordem de Mãe, com sua chancela, a mesma com que autorizou Mandela, assino o indulto aos que mantiveram a herança dos meus, no breu, em estado oculto.
É chegada a hora. Meu povo canta, ri, reza e chora às vésperas de uma nova aurora e, acampado no negro céu do Cruzeiro do Sul, deuses de África adornam os altares e acendem a lua de Palmares pra iluminar a marcha à santa Liberdade…
Mas, povo de minha raça, não se esqueça, Maafa, quando velas invasoras singram o oceano, em fímbrias do solo africano insuflam conflitos, instauram sangrentos ritos e, algo sem precedente surge no livro da humanidade, a escravidão negra.
É carregado de angústia e dor que retorno a esse instante, mas sou Griot, um tambor, do Criador, ordenança, trago-vos isso, à lembrança para que nunca mais, a tal semelhança, algo nos acometa.
Ó! Povo da pele preta, atento, quando cortejado. Naquele nefasto momento chegaram juntos, impostores do profano e do sagrado envoltos num mesmo véu, um, à sangue, retalhou nossa terra, o outro, nosso céu.
Na escuridão dos tumbeiros, reis, rainhas, guerreiros presos às correntes do cativeiro cruzaram o Atlântico, muitos enlouqueceram, outros tantos mancharam as vestes de Iemanjá com o sangue de suas crianças.
Por esses, no Novo Mundo, meu povo foi ao profundo para religar-se à essência.
Não sabiam o que traziam, os sem valia, nos porões dos negreiros, erraram, esses forasteiros.
Como calar num guerreiro seu canto revolucionário? Não há, em sã consciência, alguém que a outro pertença que resista à violência de seus sonhos libertários.
E nas Américas, um novo cenário.
Fundem-se nossas culturas, como se fundem os matizes de originais tinturas extraídas de diferentes raízes para assim tornar possível uma pintura nova, fecunda e arrojada.
Eis a envergadura da diáspora africana nas terras do Mundo Novo.
É uma nave colossal, fulgurante, colorida, voa com a elegância da negra que dança ao som dos tambores, canta com a voz quase santa que borda a garganta de nossos cantores, faz na instigante cadência do jazz, do samba, um novo grito do Ipiranga, traz, do passado, os pilares para que se reerga Palmares, o porto seguro e, do tesouro ancestral, em urgência espacial, a pedra fundamental do quilombo do futuro.
Pousa no céu da Vai, Vai. No contato imediato, além do terceiro grau, eu, o Griot Afronauta, autorizo, à ribalta meus tambores, ousem meus trovadores, poetas, magos, atores no palco do carnaval.
- FICHA TÉCNICA
Fundação: 1/1/1930
Cores oficiais: Preto e branco
Presidente: Darly Silva (Neguitão)
Vice : Anna Maria Murari Gilbert Finestres
Carnavalescos: Hernane Siqueira e Roberto Monteiro
Mestres de Bateria: Tadeu e Beto
Primeiro Casal de Mestre-Sala e Porta-Bandeira: Reginaldo Romualdo Pereira (Pingo) e Paula Fernanda Penteado (Paulinha)
Diretor Geral de Carnaval: Lourival de Almeida Campos
Diretores de Harmonia: Edson Francisco Paulino (Buiu)
Rainha de Bateria: Camila Silva
Intérpretes: Grazzi Brasil
Colocação em 2018: 10º Lugar – Grupo Especial
- Ordem do Desfile em 2019
Grupo Especial – Sábado – 02/03
4ª Escola à Desfilar – 01H45
- LETRA DO SAMBA
Compositores: Edegar Cirillo, Marcelo Casa Nossa, André Ricardo, Dema, Gui Cruz, Rodolfo Minuetto, Rodrigo Minuetto e Kz
ENREDO 2019 – VAI VAI – O QUILOMBO DO FUTURO
É que eu sou da pele preta
Quilombo do povo… Sou Vai-Vai
Um privilégio que não é pra qualquer um
Protegido e abençoado por Ogum
Axé… Eu sou a negra alma do Bixiga
Herança que marcou a minha vida
Tem que respeitar minha raiz
O Orum vai desvendar toda a verdade
Pra resgatar a nossa identidade
Das linhas que a história apagou
África… A negra mãe da humanidade
Nas marcas de um passado tão presente
A luta que Mandela ensinou
É a força de lutar por nossa gente
Clamando a justiça de Xangô!!!
Ô Inaê… Rainha do mar!
Alodê… Iabá, Odoyá…
Cuida de mim Mamãe
Leva meu pranto
Em seus braços o meu acalanto
Ecoa o grito forte na senzala
Nos olhos brilha um novo amanhecer
Aruanda ê… Aruanda…
Trago a força de palmares
Pra vencer demanda
A liberdade é minha por direito
Não vamos tolerar o preconceito
Somos todos irmãos
E a luz da razão vai nos guiar
Sorrir… “sim, nós podemos” sonhar
Pois temos um futuro pela frente
Punhos cerrados a Saracura está presente.